sexta-feira, 17 de abril de 2009

Diretor da AMOUR publica artigo no Globo sobre o desenvolvimento da cidade do Rio de Janeiro

Em artigo publicado no jornal "O Globo" de 17.04.2009 o arquiteto urbanista Luiz Fernando Janot expressa a sua opinião em relação a determinadas questões polêmicas que envolvem o desenvolvimento da cidade do Rio de Janeiro. Com isso, demonstra o seu comprometimento não apenas com o bairro da Urca, onde exerce o cargo de Diretor da AMOUR, mas com os problemas que permeiam a vida dos moradores de nossa cidade. Transcrevemos, a seguir, o artigo publicado.

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“MUROS QUE PREOCUPAM”

Luiz Fernando Janot

Arquiteto Urbanista

Professor da UFRJ


Apesar de reconhecer a dificuldade do poder público para atuar de maneira eficaz nos territórios dominados pelas diversas facções que controlam o tráfico de entorpecentes ou pelas milícias que atuam no comércio ilegal de imóveis, na distribuição de gás e no transporte público alternativo, podemos afirmar que algumas soluções anunciadas recentemente para controlar a expansão dessas comunidades não passam de paliativos diante dessa perversa realidade.

O chamado poder paralelo, encastelado em praticamente todas as comunidades populares, vem estendendo os seus tentáculos por quase toda a cidade e promovendo, direta ou indiretamente, assaltos à mão armada nas ruas, residências e estabelecimentos comerciais, roubos de cargas e veículos e os famigerados seqüestros relâmpagos. Presenciamos uma espécie de ditadura cruel e implacável que interpõe seu poder aos cidadãos desqualificando os princípios que devem reger a vida numa cidade democrática. O agravamento vertiginoso desse quadro vem despertando o medo generalizado na população e, consequentemente, a idéia de que a segurança só se encontra em espaços fechados ou de acesso controlado. Compromete-se dessa forma a vida nos espaços públicos tradicionais.

Na verdade, a segregação no espaço urbano não é um fato novo. Na Idade Média a cidade se fechava para os perigos externos através de muralhas periféricas, enquanto hoje nota-se que algumas cidades contemporâneas se fecham em si mesmas criando espaços restritivos de convivência entre os seus próprios habitantes. Talvez essa tendência seja um prenúncio lamentável da construção de um apartheid social na cidade onde sobressaem os muros, as grades e as cercas eletrificadas que comprometem ostensivamente a imagem visual da paisagem urbana.

Uma cidade como o Rio de Janeiro não se melhora espacialmente apenas pela vontade política ou por soluções urbanísticas adotadas sem atentar para o impacto que podem causar no meio ambiente e no desenvolvimento harmonioso da cidade. O assunto é complexo e merece uma apreciação mais abrangente. Não será a construção indiscriminada de muros que irá reverter questões estruturais que existem por trás da expansão das favelas. Um grande muro periférico envolvendo as comunidades instaladas nos morros para conter a sua expansão e preservar as reservas florestais no seu entorno é uma proposta simplista e comprometedora visualmente da própria paisagem que se quer ver preservada.

Há que se controlar a expansão desenfreada das favelas, mas não dessa forma. É bom que se atente para o fato de que esses muros de blocos de concreto irão constituir, na prática, uma das paredes das casas que serão construídas neles encostadas. E, certamente, serão casas com mais de um pavimento com janelas – e portas, quem sabe? – abertas para as áreas verdes que se deseja proteger. Cria-se um ciclo vicioso. Além do desperdício de verba mal aplicada, entendemos que esses recursos poderiam ser destinados à implantação de melhorias na infra-estrutura e na construção de equipamentos de interesse social para tais comunidades.

Ao invés dos muros de concreto seria mais simples, mais econômico e mais útil criar uma faixa periférica de terreno non aedificandi com largura compatível e acompanhando uma cerca limítrofe construída com material ecologicamente adequado. Essa faixa seria demarcada por meio de uma cobertura vegetal rasteira integrada ambientalmente com a reserva florestal em seu entorno e poderia destinar-se eventualmente à construção de escadarias, plano inclinado ou local para implantação das redes de infraestrutura para a própria comunidade. Além de tudo, por se tratar de um espaço livre, facilitaria a observação à distância e o acesso por parte do poder público para controlar a expansão territorial através de ocupações irregulares.

Luiz Fernando Janot

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